Vejamos os depoimentos: as pessoas envolvidas no(s) episódio(s) são quatro: LM (o abusado); JPL abusado mas sem direito a queixa; FG e Carlos Silvino que alegadamente os levaram e acompanharam. Já nem refiro o facto de uma vez dizerem que entraram os quatro, outras vezes só entraram dois.

Fantásticas são as histórias de Carlos Silvinho dizer que ouviu, do hall, vozes e sons de rolos de máquinas a rolar, de FG descrever uma cena de pancadaria entre mim e Silvino nesse hall e, noutro depoimento, dizer que foi no "Café 2+2" onde nunca entrei na minha vida (comprovado em tribunal pelos seus empregados). Tudo isso eu desprezo. Nem sublinhar a estupidez, que seria a minha, de usar um apartamento logo na porta ao lado do de um colega meu da RTP (eu que supostamente deveria andar na clandestinidade).

Não posso é deixar de estranhar que a investigação não tenha ouvido ninguém daquele prédio para além da dona do apartamento (a enfermeira que entretanto faleceu e que negou tudo) e da porteira que, ouvida pela primeira vez não assinou nenhum Auto, e uma segunda vez onde declarou o óbvio: de Carlos Cruz, nem rasto.

Mas vejamos coisas mais substanciais. E comecemos pela descrição e desenhos do interior da casa:

1-     Nos desenhos (feitos em julgamento), nada corresponde à realidade com especial importância o facto deles representarem um corredor com salas de um lado e doutro quando na verdade só havia divisões de um dos lados.

2-     LM diz que a casa tinha uma sala com sofás e um quarto com uma cama e um guarda-fatos; FG afirma que era uma espécie de estúdio com holofotes; e JPL faz uma descrição surrealista: o apartamento onde vivia a enfermeira Maria Odete Ferreira não tinha nada lá dentro. NADA. Pensou que fosse um escritório pois só tinha uma alcatifa "daquelas que se colam no chão". Mas nem um móvel. A uma pergunta do Juiz José Manuel Barata disse: "nem uma cadeira! Passou-se tudo de pé!"

E a pergunta é: qual destas versões é verdadeira? Como é que duas pessoas que, agora segundo o Tribunal com a alteração das datas, estão no mesmo local, ao mesmo tempo dizem, um que não havia nada lá dentro e outro que havia uma cama, um guarda-fatos e sofás?

E os depoimentos?

1-     LM afirma que foi SEMPRE depois de jantar e que foi transportado por Carlos Silvino no carro deste, um Fiat 127

2-     FG diz que foi sempre ao fim da tarde e que foram com Silvino numa carrinha Renault Traffic

3-     JPL não faz referência ao período do dia mas diz que foi numa Mercedes Vitto

4-     Carlos Silvino afirma que foi ao Sábado e Domingo, de manhã, precisando horas: 9:30 e 10:30.

JPL perante a Juíza de Instrução não refere a Av. das Forças Armadas. Diz que apenas esteve em Elvas, no teatro Vasco Santana e em casa de Jorge Ritto; em julgamento diz que "não sabe o que foi lá fazer" (às Forças Armadas) mas dois dias depois já diz que afinal foi abusado.

5-     Em inquérito LM diz: (16.01.2003)- "Lembra-se que foi num dia da semana. Lembra-se que o João Paulo disse ao depoente se queria ir a casa do Carlos Cruz. O João Paulo disse-lhe que tinha sido o "Bibi" que o tinha mandado ir ter com o depoente e fazer-lhe a proposta.

O depoente aceitou, pois ele era uma pessoa conhecida da televisão e queria conhecê-lo pessoalmente

Também lá estava o JPL e o FG. Foram no carro do "Bibi", um Fiat 127. Chegados lá subiram os quatro e o Carlos Cruz estava lá.

Mas em 09.04.2003 afirma: Chegados ao local o depoente ficou admirado pois tratava-se do conhecido apresentador de televisão Carlos Cruz.

Em 3.01.03 (curiosamente apresentado como segundo depoimento mas com data anterior ao que está acima): "Relativamente a Carlos Cruz também confirma que este teve contactos sexuais com o depoente, mas apenas uma vez numa casa, que seria a dele."

Em 10.03.2003: "Em relação ao Carlos Cruz deseja rectificar e diz que esteve por duas vezes numa casa que pensa que seria a dele."

Melhor ainda, no mesmo dia: "Pensa que também ia outro colega mas já não se lembra quem era."

Não se lembra?! Ora, o "outro", segundo a acusação, era JPL, um dos seus melhores amigos e colega de Lar!

Em 18.11.2003: "A única vez que o Bibi o transportou no seu Fiat 127, levando-o a um local onde viria a ser abusado, foi à casa do Carlos Cruz, na avenida em que se subia e se voltava à esquerda, em Lisboa

-não se recorda, agora, quem foi consigo nem como se deslocou ao local.

Em Julho de 2003, na Perícia Psicológica, no Instituto de Medicina Legal: "Refere que o apartamento ficava no 3º andar, e que subiram de elevador "era um elevador antigo, mas com porta igual ao deste (do INML), de metal (sic)."

O Luís e o amigo ficaram a ver televisão e a falar um com o outro.

Bibi veio chamá-lo e levou-o até ao quarto, onde se encontrava o Carlos Cruz, deixando-os sozinhos

Ora Carlos Silvino afirma que nunca entrou no apartamento!

Em 10.03.2003, no mesmo Instituto para a perícia física: "Eu e o Bibi começamos a sair juntos...a primeira vez que me levou tinha eu para aí 14 anos, disse-me que ia conhecer uma pessoa importante, fomos a casa do Carlos Cruz, num prédio de uma avenida em Lisboa...lembro-me dele por o conhecer da televisão ...ia eu e um colega meu que eu não conhecia...o Carlos Cruz estava sozinho, abriu-nos a porta, a nós e ao Bibi...esteve algum tempo a conversar connosco e depois o Bibi desceu e ele levou-nos para um quarto e mandou-nos despir... a mim não me fez nada só ao meu colega...depois de acabar mandou-nos vestir e fomos embora.

LM nasceu em 28.9.86. Logo, se tinha 14 anos seria em Setembro de 2000. A acusação situa os factos entre Dezembro de 1999 e Março de 2000.

A enfermeira Maria Odete Ferreira foi ouvida pela PJ em 25 de Fevereiro de 2003. Faleceu pouco depois, com cancro. Disse à PJ:

Aos 69 anos aposentou-se e tem estado sozinha desde então (tem agora 77 anos de idade). Continuou a fazer a sua vida independente como sempre . Só há cerca de 4 anos é que a senhora que faz a manutenção das escadas do prédio, a Dª Rosa, ficou com a sua chave de casa e passou a ir lá dar-lhe uma ajuda na manutenção da sua casa - por ter ficado debilitada e sentir-se doente.

Esclarece que apenas por uma vez, no Verão de 1999, recebeu em sua casa três amigas brasileiras (uma avó com a filha e a neta), que conhecera numa das suas viagens . Nunca emprestou a casa a ninguém mais, nem consigo lá, nem quando saía.

Não tem amigos ou familiares que a visitem com filhos ou miúdos pequenos ou jovens adolescentes.

Perguntada acerca das suas fontes de rendimento, respondeu que tudo o que ganhou até hoje adveio unicamente do seu trabalho como enfermeira e da reforma que passou a receber após a aposentação. Não sabe ao certo mas pensa que a sua pensão de reforma era cerca de 1.500,00€

Por precisar de companhia e apoio para manter-se em casa, uma sua amiga e colega do Hospital Santa Maria indicou-lhe uma sua amiga para vir dar-lhe esse apoio - foi assim que conheceu a Celeste Maria Evangelista.

A Celeste ficou com a sua chave de casa para poder entrar de manhã, dar-lhe o pequeno almoço, o almoço e o jantar e ainda dar-lhe um jeito na limpeza da casa . De início fazia-lhe oito horas e depois passou para quatro horas - quando a arguida começou a poder levantar-se e ir tratar do seu jantar. (...)

Questionada, respondeu que, desde que começou a residir sozinha na morada em causa, nunca cedeu o espaço a ninguém a qualquer título. Desde que vive sozinha, nunca subalugou um quarto ou convidou alguém a partilhar de novo a sua casa consigo.

E nós arrolámos e ouvimos: várias pessoas que vivem ou trabalham no prédio. E a família do apartamento ao lado do da enfermeira (dum ex-colega meu da Rtp) que nunca me viu nem ouviu falar de mim no prédio.

E eu, que era tão cuidadoso ia logo para um apartamento ao lado de outro onde vivia um colega meu da RTP?

E ouvimos: o dono do café da esquina;  E mais: o dono e empregados da empresa de estafetas onde se encontra a célebre porta das traseiras (por onde todos dizem que entravam) e que se encontrava fechada a cadeado até Junho de 2003 porque o serviço de estafetas se tinha mudado para outro edifício ali perto. Chegou a ter um papel na janela para as pessoas que se dirigirem à porta da frente. Um rapaz diz que Carlos Silvino tocou à campainha e não existe nenhuma campainha.

O Vídeo da visita do Tribunal ao prédio: apenas levou Carlos Silvino e não levou nenhum assistente. Também não entraram dentro do apartamento pelo menos para ver as divisões que não correspondem em nada aos desenhos feitos por LM e JPL.

Nesse vídeo, que a lei não permite mostrar, percebe-se que também Carlos Silvino nunca lá subiu: aponta a porta do lado direito quando se trata da do lado esquerdo; diz que as portas eram todas iguais mas FG diz que uma era mais clara que as outras duas; diz que havia um monta cargas o que não é verdade.

No dizer feliz do Dr. Ricardo Sá Fernandes: será que toda a gente daquele edifício era meu cúmplice como no caso do filme Rosemary's Baby? Existiria ali um grupo satânico que me protegia?